quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Iluminado ao sol do mesmo mundo

canto o engodo de mil séculos
com o trottoir das putas sem carteira profissional atravessado na garganta.
à magerma mão do escriba
as palavras dos antigos sonhos fadados,
dos quais emergem as cítaras e os madrigais helênicos
apreciados por variações platônicas de Aristóteles sem metafísica;
aos mesmos olhos antigos
a fleuma dos pequenos povos feudais com as suas insossas canções pro amigo e pra amada.

história da sucessão de desgraças dos fracassados, vos bendigo com toda a parcimônia
dos meus fígado e pulmões carcomidos pelas ilícitas-lícitas substâncias
que movimentam o mercado através dos impostos governamentais,
pondo em xeque as vidas dos seus viciados por dar margem
a ascensão das grandes e pequenas empresas,
fazendo volume à bolsa sem fundo da ordem capitalista,
levando ao chiqueiro seus porcos com direitos trabalhistas e folgas aos domingos.

ó mundo das feras, arrepia-me a pele o sentir de vós em cada uma de suas injustiças,
os quilômetros de avenida que separam um homem do outro
e os fazem tão próximos dos seus pequenos cachorros mais afáveis
que qualquer pensamento e raciocínio...

Ah vida, canto-te em toda complexidade da sua decadência
com as têmporas aquecidas pelo vinho diabólico dos instantes que passam.
sou tudo na soturnidade dos crimes desferidos por entre os becos
das capitais sem fim.
enlevo a minha mão para roubar-lhe o que não tem,
pois me obriga ao roubo o fado de não ter o suficiente para exibir-me.
tiro das calças o revólver para matar-lhe,
pois não me espreita à consciência a idiotice da razão.
transgrido a lei no momento em que esta
me aponta, com a sua cálida mão burguesa e rósea, as suas brechas
e me embrenho dentro dos grandes tribunais da justiça.

Eu sou deus e luto pela sociedade dos larápios!
não ouvi, das bucólicas margens dos rios brasileiros,
o brado retumbante de um povo heróico!
perscrutei com os olhos a poética miséria dos bêbados e putas
sob as marquises dos prédios públicos e de lá, ó infernal existência,
saiam homens bonitos com as cabeças transbordantes em Maquiavéis,
déspotas esclarecidos sem conhecimentos em geometria,
serafins engravatados e indiferentes ao absurdo...

Pela chaga aberta em Aquiles, grande mestre da espada ferido no calcanhar,
e por isso morto com a fraqueza execrável dos convencionais homens fracos,
vinde a mim toda a tristeza do mundo,
me ponhais sobre a cruz para lhes aliviar o pecado,
encontrais em mim todas as mentiras e basbaquices que são ofertadas pelas igrejas,
chicoteai-me para não se verter sobre os seus corpos o cancro,
mordei-me a pele de modo que lhes possa curar o coração com a minha carne santa!

absorto no branco intranqüilo desta folha.
parar de escrever.
é feriado.

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