terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Ao longo da 101

Os trabalhadores se reúnem nos terminais às 06:00 da manhã e começam comungar o cotidiano previsível. Ao longo das plataformas de embarque, pequenos aparelhos propalam músicas desagradáveis, bornais pesados exercem força sobre costas meio que curvas e depois atrapalharão o tráfego de pessoas nos corredores curtos dos ônibus. Remelas que resistiram ao banho tomado entre bocejos de cansaço esmeram o canto de olhos sonolentos e são tiradas com passadas de dedo vagarosas. O pedinte não falta ao seu ofício, cruza todo o terreno circundando os cristãos e garante o santo pão do dia. Mas o sol vem encontrar o braço que coloquei para fora da janela. Colossos de toda cor se espalham pela estrada e o seu suor levanta pontes e viadutos. O meu amigo pilota o carro a cem quilômetros por hora, fumando um cachimbo Sherlock Holmes que pesa sobre o canto de sua boca. Os olhos escondidos por detrás das lentes denunciam um homem feliz. Ao longo da BR, barracas de lona, bandeirinhas vermelhas do movimento Sem Terra e caminhões gigantes carregados de cana surgem de curvas perigosas a todo instante. Máquinas modernas irrigam o verde enquanto outras o recolhem para o comércio. O açúcar armazenado recende o seu cheiro virgem e orgânico e tão logo será exportado. Postos de gasolina decadentes, engordurados e enegrecidos pelo óleo diesel vazado dos automóveis pesados que ali estacionam. Lanchonetes e churrascarias afogadas num montante de muros abrigam viajantes de todos os lugares, do norte e do sul, e nelas sorriem alto ao mesmo tempo em que comem. Os cabarés e bares encardidos de quinta categoria, as extensas plantações de fumo ornando Arapiraca e Palmeira dos Índios, os belos engenhos antigos e as fábricas modernas soltando fumo cinza nos céus de Pernambuco. Nordeste: predicado primeiro deste grande e diverso país latino.

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