quarta-feira, 17 de março de 2010

Extratos da gripe

a tosse rasgada irrompe de dentro
apertando, em espasmos, a região posterior da cabeça.
e são sempre essas doenças e esses xaropes,
e as reprimendas inesgotáveis que saem das bocas.
não quero fazer nada,
cansa-me pensar em fazer qualquer coisa.
que se apodreça esse pedaço de maçã
fincado nas costas!,
decerto que dentro das indústrias se desconhece
o suspiro sufocado dos enfermos...
todos têm se voltado somente à Jesus
e não se atem à cena cúpida dos dois irmãos
cruzando os seus órgãos no quarto ornado,
pois nos recitais dos livros de história
não há sequer um parágrafo que conteste a sexualidade dos eleatas
e, por isso, vivo essa febre malsã da metafísica
que me fez uma enorme cicatriz na cara,
sendo passível ao meu consentimento,
agora que me dou às conjecturas prolongadas,
as idéias criminais de Raskolnikóv,
pois até mesmo a minha tosse infernal
é uma convenção de linguagem.

Ah... E essa Sibéria sem fim dentro do coração,
esses estirpadores e batedores e homicidas dentro do coração....
essas elegias declamadas por vozes guturais,
esse aviltamento do crime e da loucura dentro do coração...
esse amor às ferias cobertas de pus, essa vontade de beijá-las
e lamber-lhes com língua úmida dentro do coração,
essa vontade de incinerar
e fazer sangrar vários corpos, essa avidez por vingança
por ter sido assim o destino dentro do coração...

Eu quero ópio,

Um comentário:

  1. Sinceramente, essa poesia me causou um estranho conforto. Algo como se me sentisse em casa. A penúltima estrofe é surreal.

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