segunda-feira, 12 de abril de 2010

Libertad

tem-se falado, com prazer inefável, em todas as casas,
sobre a virtude. a grande aposta do século, alçada junto às
novas idéias, precedida pelas sensações do ópio
e as devastações das duas guerras mundiais, tem um só nome: felicidade.
se de Napoleão à Hitler, desde França aos mais glaciais
campos russos, se custeara a preço de sangue
a conquista da liberdade e da honra, ao púlpito
dos grandes déspotas, em tempo dividido pelo incerto e o devasso,
já não se ergue mais a mão-de-ferro que, outrora, apontara,
igualmente a hoje (de um outro modo), o rosto do povo.
a desolação e o cansaço, mesmo sendo clara a anomalia,
muito embora nos convide, com mãos afáveis e braços abertos,
a um momento de solidão concentrada junto ao seu corpo,
nos é, todavia, sentimentos impossibilitados.
quando nos cinge o coração as mais puras expressões da tristeza,
como se fosse estranho ajoelhar-se perante aquele cansaço,
que nos acomete às vezes de maneira tão súbita,
devemos nos esconder nos desertos corredores do recolhimento
para que não sejam censuradas, de forma tão humilhante,
as lágrimas que nos descem dos olhos, inundando e iluminando o rosto.
estar triste, como se lê na capa dos livros,
nas linhas científicas dos periódicos semanais
e nos versos, aviltados pelas paixões, dos poemas mais românticos,
não é um direito, como nos falara os pregadores da liberalidade...
- não, é claro que não é um direito!
estar triste, nesse nosso século, é um pecado!
Sendo evidente o paradoxo, resta-nos, como se percebe,
se não a resignação, por não ser permitido o gozo em tal estado de sentimento,
o desdém a tudo isso com as nossas risadas mais debochadas;
risadas que se dão não pela falta de pertinência das idéias novas,
mas pela falta de pertinência que sempre jazera sobre qualquer idéia
que alguma coisa ousara.
À categoria dos intelectuais só se chega ao clima consensual,
ao que se parece, não por intermédio do verdadeiro consenso,
que estabelece positivações para todos os lados em questão,
mas mediante a existência da principal prerrogativa,
do vinho que dá torpor aos sentidos destes homens maus,
passados por nobres: o absurdo!
Sim, a idéia sobre os direitos das nações,
os limites da civilidade de cada indivíduo,
as teorias de cunho metafísico e a elaboração de projetos
com caráter complexo pela ciência, tudo isso, sem nenhuma exceção,
sem nenhuma distinção, só tem um motivo: serem absurdos!
visto isso então, qual seria, pois, os fins da arte?
de se pintar com cores vivas o branco de uma tela
ou de se encher com palavras torpes o branco de uma folha?
a arte, nesses tempos onde não é permitido que se prostre o corpo,
deve ser o contra-argumento, o refute que tem o dever de sodomizar
as intenções visivelmente fúteis daqueles que, à frente das instituições,
nos governam, fazendo conosco o que bem entendem e acham certo,
suprimindo, em virtude da satisfação própria e da tristeza alheia, as nossas liberdades,
trancafiando-nos numa redoma que, mais do que a mundo,
fede a esgoto...

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