segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Sobre a poesia e o poeta

Não há felicidade na poesia. Parafraseando o pensamento de qualquer artista com o mínimo de sensibilidade, cabe advertir que as artes se revelam porque a vida não basta. Sobre os limites que podemos atribuir a ela, sobre os seus fins e as bandeiras que a define, estes são pontos obscurecidos por seu principal precedente: o autor. A arte se manifesta numa dada pessoa através de uma pulsão filosófica. Para tanto, é necessário que algum fato, algum acontecimento, avilte a experiência de vida daquele que será o demiurgo de suas próprias manifestações apolíneas, sendo dada, assim, origem a novas tragédias figurativas - novos atavios que afastam o mundo da sua essência. O poeta que se nega a fazer a trajetória de Orpheu pelo Inferno não é digno de ser reconhecido como poeta. A poesia, além de ornamento das línguas e cultura dos povos, é também um elemento místico a partir do qual são reveladas as tragédias cotidianas que nos escapam aos olhos. Conhecer o mundo destituído de luzes corresponde a trilhar encruzilhadas deliberadamente metafísicas, das quais só temos conhecimento por causa das religiões e dos livros de filosofia - ferramentas claramente limitadas. Por isso, por tentar subverter o gênero e acrescentar novos elementos à razão dogmática da qual os intelectuais são escravos e à passionalidade cega dos religiosos, é que o poeta é o soldado vanguardista do nada, posto que a sua vida percorre dois caminhos, evidentemente sem pertencer a nenhum deles, num constante embate entre a vontade de dizer e a limitação de não haver mais plavras: o real e o impossível. Por estar em um e aspirar o outro, torna-se certo que o que sobeja o poeta não pode nunca se materializar como obra concreta; sempre lhe restará a frustração de saber que faltou alguma coisa. O que falta ao poeta em relação ao seu poema é o que falta às pessoas em relação ao mundo: falta o caractere não passível de ser apreendido por um ser cognoscitivo. Afirmar isso é o mesmo que dizer que o que aspira o poeta está fora da linguagem - do que ele mesmo usa para achar o seu tesouro perdido. Sendo assim, a sarjeta é consequência do exercício da poesia e o mais próximo que o poeta chega da plena fruição das artes.

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