sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

A metafísica da beleza ou Da igualdade entre as inteligências

Uma conhecida disse-me que todos nós éramos iguais. A julgar pela natureza física do ser humano, se descartamos a deficiência que adorna o corpo do coxo, somos sim todos iguais. Reduzirmo-nos, contudo, a uma comparação fisiológica não nos faria diferentes de uma anta ou de um papagaio. E como não nos é novidade que pensamos, afinal nós somos os agentes onde se encerra esta proficiência, a faculdade de elaborar idéias e, delas, paradigmas, faz-nos, perante as outras espécies, superiores. Propositura, em termos, ainda contestável. Entretanto, diminuindo as maçadas, falemos apenas de nós mesmos, homo sapiens sapiens. Ora, a minha conhecida, ao falar-me isso, pôs as qualidades que ela julga que eu tenho sobrepostas às dela. Quando a dita cuja tirou suas conclusões acerca da natureza humana, tratávamo-nos como seres providos de inteligência, pois, se falávamos sobre isso, só assim poderíamos ver a nós mesmos. No ato da conversa, como de praxe, trouxe à luz da discussão citações de alguns autores. Como estava diante de uma rapariga bela, tentei prefigurar-me atraente. Em nenhum momento, porém, descartei a idéia de que o seu nível de beleza física sobrepunha o meu, porque essa era uma constatação muito evidente. De modo a equiparar as inteligências, a moça disse-me que cada um tinha a sua, e para alguma coisa. Não discordei – pelo contrário, a todo o momento fiz gestos afirmativos para ela. Mas reconhecia naquele discurso democrático vontade de dominação. Mesmo sendo bela, eu sobre os autores. Isso, de certo modo, afligia o seu ego. E para ela, talvez, ser inteligente e não conhecer os mesmo autores que eu não era ainda suficiente. O argumento das inteligências surge, então, como artifício retórico para sua defesa: ela, além de bonita, tinha um discernimento específico, e eu, despossuídos dos atavios corporais muito prendados, tinha apenas minha inteligência específica. O que se percebe é que ela reduz a igualdade à questão da inteligência, mas em nenhum momento faz referência à igualdade dos atributos corporais de cada um. Por isso, reafirmo: implicitamente a inteligência, para ela, é mais importante, posto que ela a pôs como balizadora de nossa semelhança. Os caracteres estéticos são deixados de lado; ela, mesmo sabendo que os tem e é diferente dos feios inteligentes por causa disso, quer também demonstrar que é alguém provido de senso. Ela, ainda implicitamente, aceita que somos diferentes nos quesitos de beleza (porque ela é bela), mas nega abertamente que somos distintos nos quesitos de inteligência (porque reconhece que a sua é limitada). De outro modo, a equivalência que ela supõe haver é uma forma de tiranizar o bom senso em seu favor, de modo que, socialmente, a sua pessoa seja hegemônica em todos os sentidos. Se assim não fosse, o aluno raquítico de filosofia não seria por ela menoscabado, tampouco eu ou qualquer outro com características físicas similares. Essa associação se prolifera, também, noutras perspectivas, a partir das quais podemos examinar que os termos que definem os relacionamentos, por parte de mulheres que defendem idéias semelhantes, pendem sempre para o lado da convenção e do espetáculo em vez da igualdade. No entanto, encerremos por aqui.

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