sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
Reflexão sobre mim mesmo
Desde que deseje meu pensamento, eu posso tudo. Dentre os autores estadunidenses, satisfazem-me mais os aventureiros. Na França, juntamente com Baudelaire e seus ensaios em menção dos vícios, afeiçôo-me às desventuras do personagem soturno Celineano. E a minha Tristessa, além de puta, também mora no México. Sou plagiata: intérprete pífio de Raskólnikov – como ele, tenho também as minhas longevas Sibérias guardadas cuidadosamente dentro do peito. Não há pensamento que eu externe que não tenha sido fomentado em ficção. Peguei da literatura uma vida emprestada e os disparates que digo são, por vezes, uma metáfora crítica de autor x a um problema tal. Ao passo, porém, que são mais absurdos e torpes os personagens, o grau de encanto meu com o que eles dizem exige que lhes afiance a normalidade minha e encorpe com perfeição as suas loucuras, de forma que seja quase imperceptível o simulacro. De uns tempos pra cá, dei-me a alcunha de cão – como nalgumas mulheres lhe caem à medida algumas roupas, encaixou-se bem à minha fisiologia o apelido. Por ora chego mesmo a pensar que eu Diógenes. E seria, se não me faltasse a originalidade.
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