terça-feira, 12 de outubro de 2010

Em defesa da vida: a favor do aborto

A supervalorização da vida, em detrimento das condições que esta oferece, realmente me irrita. Dois adjetivos podem ser atribuídos aos defensores dessa moral: convencionados e irracionais. Reconhecendo que o excesso de paixão embota o pensamento humano, sempre suscetível às mais frugais idéias que possam vir à tona, faze-se necessário, pois, emular alguns pontos que considero plausíveis para a desbestificação do assunto. Utilizo um exemplo, que talvez esteja mais presente na realidade que quem o desconsidera, para alinhar os objetivos da presente argumentação. Sendo assim, suponhamos uma mulher. De espírito tão pobre quanto de pecúlio. Há dois anos, época em que largara o marido, mantém relações sexuais avulsas com alguns homens tão miseráveis quanto ela. Até o momento não pegara uma barriga talvez por força do destino. No entanto, para grande desgosto seu, depois de dois meses sentindo vertigens constantemente, após ter feito um exame caseiro de gravidez, descobriu que estava à espera dum ser que daria início a sua prole - o que foi confirmado também por um médico. Infeliz com a notícia, de imediato se arraigara na sua cabeça a idéia do aborto, por vários motivos os quais, mesmo que não pensados por ela deliberadamente, inconscientemente existiam. Procurara, então, informar-se de meios e de pessoas que pudessem ajudá-la a pôr fim ao seu degredo. Para tanto, não mediu esforços em gastar suas economias, de modo que rapidamente, no seu bairro mesmo, encontrou uma pá de gentes com conhecimento no assunto. Como não queria se submeter a uma cirurgia de retirada do feto, foi recomendada a tomar determinado remédio que, logo em pouco, degeneraria à "criança". Entretanto, malogrando os seus anseios, o pequeno feto resistiu à química da droga e, à revelia do seu desejo, veio ao mundo... para tão logo ser abandonado numa lata de lixo. Fim da história. Partindo do princípio de que um feto em gestação talvez nem sinta dor, pelo menos não da forma como a sentimos, nada nos obsta a não chamarmo-lo de humano. Ora, um ser em gestação está impossibilitado de manter contato com o mundo, logo a principal faculdade que faz de alguém um homem - a criação de linguagem e de enquadramento a esta - não lhe faz "ser cognoscível e cognoscitivo", o que vem a firmar que a sua existência ainda não é elementar. Prova disso é quando comparamos uma mãe que perde um filho quando no seu nascimento e uma mãe que perde um filho já com os seus dez anos de idade. Não que este último não vá também ser, com o tempo, esquecido, mas o período cronológico com que isso acontece, em relação ao primeiro, será mais rápido. Porque os laços ainda não se fincaram; a ausência de convívio não aviltou o afeto entre mãe e filho. O tempo, na minha leitura, determina a motivação afetiva; não obstante, é preciso os anos de relação familiar para que os sentimentos recrudesçam. Esse pensamento, quando levado para a questão do aborto, soma-se aos motivos pelos quais não devemos mistificar a prática do ato. A pequena largura cronológica de intimidade, principalmente para mães que decidem abortar já nos primeiros meses de gestação, não é suficiente para determinar o ser gestado como homem; a natureza, sempre muito difusa, se mostrara contrária ao seu nascimento, o que representa um caso, que quando acontece, quase sempre frustra a experiência de vida desse ser indesejado. E que direito temos nós de trabalhar pela infelicidade do outro? Porém, evidentemente, o que não pode haver é a banalização do aborto, fato que se concretizaria mediante falta de regulamentação, vindo a se tornar um peso para os cofres públicos. Todavia, falamos aqui de uma política pública, traçada a partir de estudos rigorosos, que decerto não permitiriam a 'caustificação' da prática abortiva. Portanto, para finalizar, cabe a nós, a partir dessas constatações, avaliarmos parâmetros que não permitam o menoscabo da vida, de forma que a sua acolhida não tenha, para tantos, sabor amargo. As bases, sobre as quais o aborto não se finca, são construídas, inicialmente, através de investimentos em educação e trabalho - elementos de uma política favorável à vida. Desse modo, para  não se estabelecer leis tolas e que não açambarcam a flexibilidade da sociedade, é preciso que quem as delibera comece a olhar para o próprio nariz antes de se sentir coagido pelo peso da cruz. A tolice é mais pesada que ela.

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